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Todos os domingos fossem assim

Por Jornal Sporting
14 Dez, 2015

Assinalam-se hoje 29 anos sobre o 7-1 ao Benfica, o resultado mais desnivelado de sempre entre os rivais

O 7-1 ao Benfica tem o seu quê de 25 de Abril. Não pela data nem pelo seu significado, mas pela inevitabilidade da pergunta que desencadeia: ‘onde estavas naquele dia?’. Para Damas, Gabriel, Virgílio, Fernando Mendes, Venâncio, Mário Jorge, Oceano, Litos, Zinho, Ralph Meade e Manuel Fernandes, a resposta é pronta: no Estádio José Alvalade, dentro de campo, a brilhar. E hoje, dia que se assinalam 29 anos da maior goleada de sempre entre os dois rivais, onde estão os 11 bravos ‘leoninos’? 

Manuel Fernandes, Virgílio e Venâncio permanecem na casa que os celebrizou com a bola nos pés. O antigo avançado integra a estrutura do futebol e é responsável pelo departamento de ‘scouting’, enquanto Virgílio tem a pasta da formação e o seu antigo colega no centro da defesa treina a equipa de iniciados que, na temporada passada, foi campeã no Seixal, derrotando o eterno rival nos últimos instantes do jogo decisivo. Gabriel, depois de alguns anos como treinador de várias equipas do escalão secundário, conduz um táxi no Porto, Fernando Mendes é comentador de programas desportivos e Mário Jorge foi até há pouco tempo director desportivo do Estoril. Oceano, que chegou a treinar a equipa B do Sporting e também a equipa principal, de forma interina, depois da saída de Sá Pinto, voltou a juntar-se a Carlos Queirós – que o escolheu, em 2009, para comandar a Selecção de Sub-21 – e é hoje seu adjunto no comando da Selecção do Irão. Litos também se dedicou ao treino e, após passagens por Estoril, Portimonense (que fez subir à 1.ª Liga) e Leixões, passou a técnico da Liga Desportiva Muçulmana de Maputo, cargo que manteve até Novembro deste ano, quando foi substituído por Dário Monteiro. De Zinho e de Meade é de quem menos se sabe: o primeiro treina no Brasil e o segundo vive em Inglaterra. Damas, um dos maiores guarda-redes portugueses de todos os tempos – e o jogador com mais jogos ao serviço do Sporting – teve morte prematura, em Setembro de 2003, com 55 anos.

Já antes daquele electrizante domingo de 1986 em que o Sporting fez o rival sucumbir a uma derrota humilhante, o número sete rondava os prognósticos – eram sete os pontos de distância que o Benfica levaria de vantagem sobre o Sporting em caso de vitória. E já naquela altura os profetas da desgraça, ludibriados por um começo de época algo titubeante dos ‘leões’, arriscavam o cenário mais catastrofista para os ‘verde e brancos’. Foram sete, é verdade. Mas os golos, não os pontos de desvantagem...

De sete para o seu dobro, jogava-se em Alvalade a 14.ª jornada no dia 14 de Dezembro. Com 70 mil na bancada e a homenagem ao massagista Manuel Marques antes do encontro, assistiu-se a outra homenagem – mas ao futebol – nos 90 minutos seguintes. A primeira parte até revelou algum equilíbrio, com Damas a negar o golo a Chiquinho na primeira oportunidade do jogo, mas no fechar do primeiro quarto de hora, Mário Jorge abriu o activo numa recarga a remate de Manuel Fernandes. O Sporting, comandado por Manuel José, apresentava uma estratégia ousada: dar espaço ao rival para depois o surpreender em rápidos contra-ataques. No final, aliás, o treinador explicaria isso mesmo ao Jornal Sporting. “Perante uma equipa do Benfica muito rotinada, com muito automatismo de jogo, não se pode jogar ao ataque. Creio que a estratégia que montámos foi perfeita, passe a imodéstia. Já fomos batidos assim, mas também actuando em contra-ataque já ganhámos na Luz. Hoje, foi como que uma repetição”.

E se ao intervalo o Sporting vencia ‘apenas’ por 1-0, no segundo tempo cavou um profundo fosso para o seu rival. Manuel Fernandes elevou o resultado, de cabeça, ao minuto 50, e os ‘encarnados’ ainda reagiram, por Vando, na conversão de um livre. Mas logo depois, aos 65’, Meade fez o 3-1... que foi um ‘31’ para as ‘águias’. “A seguir não houve mais Benfica, este como que se sumiu do rectângulo, deixando lá os fantasmas das suas afamadas camisolas; e só houve Sporting, um Sporting transmudado, ambicioso, rápido, acutilante e extremamente prático, ‘cilindrando’ o seu digno adversário com golo atrás de golo. Até chegar ao... escândalo! Sete!!!”, lia-se ainda no Jornal. Voltando ao jogo,  Mário Jorge fez o 4-1 três minutos depois e, outros dois passados, Manuel Fernandes subia para 5-1. O treinador Manuel José ainda quis substituir o goleador dos ‘leões’, para lhe oferecer a ovação do público, mas, ao saber que Fernando Mendes não estava em condições para continuar, voltou atrás. E com isso Manuel Fernandes ainda fez mais dois golos, aos 82’ e 86’, elevando a sua conta pessoal para quatro golos e agravando o descalabro benfiquista, que obrigou Silvino, o guarda-redes ‘encarnado’ – hoje adjunto de Mourinho no Chelsea –, a ir buscar a bola ao fundo das redes por sete vezes. A desorientação dos jogadores ‘encarnados’ encontrou eco nas bancadas, onde os adeptos benfiquistas reagiram com uma fogueira, no topo norte, alimentada com cachecóis e bandeiras das suas cores, enquanto rasgavam os cartões de sócio. Só que a história não pode ser rasgada...  

“Senti que em vez de sete golos, podiam ter sido oito, nove, dez ou 11, porque o Benfica, que na altura liderava o Campeonato, era uma equipa entregue e sem reacção”, diria anos mais tarde Manuel Fernandes, que entregou a bola do jogo à sua filha, que completava nove anos no dia do ‘derby’. “Memorável, simplesmente memorável. E simplesmente, terrivelmente simples”, lia-se no Jornal Sporting, numa crónica de exaltada adjectivação assinada por Inácio Teigão. “Aquilo até chegou a parecer um massacre e só o apito de Vítor Correia salvou os ‘encarnados’ de uma punição ainda mais severa”, acrescentava, para concluir, tão simplemente: “Que foi um jogo danado, um jogo do ‘camandro’, lá isso foi...”.