"Uma nova era deve ser acompanhada de uma evolução da marca no mesmo sentido"
23 Dez, 2022
Entrevista André Bernardo - Jornal Sporting
Em entrevista ao Jornal Sporting, André Bernardo, vice-presidente do Conselho Directivo, anuncia algumas novidades do novo documento de Visão Estratégica com o foco em preparar o Sporting CP para a nova era vigente, destacando-se o estabelecimento de eixos estratégicos perpétuos, um manifesto e também o rebranding da marca.
No editorial da edição do Jornal Sporting de 10 de Dezembro, falou sobre os três eixos estratégicos de base (SCP - Sustentabilidade, Colaboração e Performance) da Visão Estratégica para 2023-2026, um documento que está em desenvolvimento. Porque definiu estas três palavras como eixos para o futuro a curto prazo?
O desafio que lançámos a nós próprios, bem como o exercício que se seguiu, foi definir eixos estratégicos que pudessem ser perpétuos. Aquilo que a maioria das organizações quer é ser, e manter-se, relevante no tempo. Isso, actualmente, é cada vez mais difícil e por isso achamos fundamental definir alicerces que consigam guiar-nos ao longo do tempo. O mundo entrou numa nova era e o Sporting CP tem de a acompanhar. E, respondendo mais directamente, achamos que Sustentabilidade, Colaboração e Performance são eixos intrínsecos e perenes que o Sporting tem de ter hoje e daqui a 100 ou 1000 anos também.
O tema da sustentabilidade tem merecido muita atenção por parte do Sporting CP. Porquê?
No dia em que deixarmos de ser sustentáveis, seremos insustentáveis. Ou seja, por definição, deixamos de conseguir existir. A sustentabilidade, no sentido lato, é precisamente conseguir encontrar os equilíbrios necessários para ter sucesso nos objectivos a que nos propomos. Esse ponto de equilíbrio implica balancear múltiplas variáveis ao mesmo tempo, como por exemplo o curto e o longo prazo, o financeiro e o desportivo, o sacrifício e o prazer, o negócio e o meio ambiente, etc... Ou seja, isto deveria ser uma preocupação constante no Sporting CP e em qualquer organização. Nós queremos retirar o condicional e que seja mesmo hoje e sempre.
E acha isso especialmente relevante no Sporting CP por que razão?
É especialmente relevante no sector do desporto porque existe, com maior dimensão ainda, uma pressão imediatista no que concerne aos resultados e uma componente muito emocional, que depois pode comprometer o foco necessário para a construção das bases fundamentais para um futuro sustentável. No caso do Sporting CP, ganhámos apenas cinco títulos nacionais no futebol entre 1980 e 2022. Neste ciclo, tivemos dois longos períodos de travessia no deserto de quase 20 anos cada um e vivemos em constantes dificuldades financeiras. Estamos ainda hoje a construir as bases que deviam estar asseguradas, que implicam investimento e tempo, e em concorrência com os nossos rivais que já as têm.
O Sporting CP anunciou que vai publicar o Relatório de Sustentabilidade referente a 2021/2022. O que se pode esperar desse documento?
Actualmente, felizmente, a sustentabilidade tornou-se uma preocupação de todos porque isso tem impacto no planeta, na nossa qualidade de vida e, em último reduto, na nossa própria sobrevivência. O Acordo de Paris é reflexo disso. O nosso documento vai estar alinhado com as directrizes mundiais recomendadas, nomeadamente a matriz do ESG. A sustentabilidade envolve as dimensões de Ambiente, Social e Governance. Estamos a desenhar uma matriz de materialidade para elencar os temas prioritários de foco que asseguram o equilíbrio do que fazemos internamente e o impacto que têm no meio externo, sobre estas três perspectivas. E serve também para definirmos métricas e acompanharmos o sucesso do seu cumprimento.
O objectivo anunciado é o de atingir a auto-suficiência energética em 50% até 2050. Vê o Clube preparado para efectuar as mudanças necessárias nesse sentido?
Quando entramos em campo é sempre com o objectivo de ganhar. Estamos a trabalhar para isso. A meta está definida, agora temos de fazer tudo ao nosso alcance para atingi-la ou superá-la.
Foi também anunciado que tanto o Estádio José Alvalade como o Pavilhão João Rocha vão ser alvos da instalação de painéis fotovoltaicos nas respectivas coberturas e que vai ser criada uma Comunidade de Energia. Já há data para esta intervenção?
Estamos a aguardar um parecer técnico e a avaliar as propostas para tomarmos a decisão final e podermos anunciar a data.
Quando vai ser publicado este documento e o documento de Visão Estratégica?
Ambos até ao final desta época.
Quais são as principais novidades a destacar do documento de Visão Estratégica?
Um documento de Visão Estratégica é um documento de linhas mestras para que todos tenham claro para onde vamos, porquê e como. Este documento tem uma linha de continuidade com o anterior, resgata o ADN da fundação do Sporting CP, mas acho que a grande novidade é que estabelece as fundações para a entrada do Sporting CP na nova era em que estamos e, portanto, é o ponto de partida para uma nova era no Sporting CP. E fá-lo com uma perspectiva diferente, desde logo, num primeiro momento, com um horizonte sem fim, em perpetuidade. Vamos definir um propósito muito claro e ter um manifesto.
Porquê um manifesto?
Aquilo que nos diferencia são os valores que temos e como actuamos em linha com eles. Um manifesto é uma forma muito clara e perceptível de concretizar o que é ser Sporting CP e o que é actuar dessa maneira, de uma forma sintética e tangível.
Há mais alguma novidade que queira revelar?
Já tínhamos colocado no anterior documento de Visão Estratégica – Regresso ao Futuro - que iríamos avançar com uma nova arquitectura de marca. Estamos agora a iniciar o processo para fazer um rebranding.
Qual é a motivação para o rebranding? E qual é o objectivo?
Uma nova era deve ser acompanhada de uma evolução da marca no mesmo sentido. A instituição e marca vivem em simbiose. Uma é a outra, e vice-versa. Vivem de uma razão de ser que deve ser comunicada de forma clara. A Apple e a Nike são dois exemplos de referência nesse sentido. Além disso, devem ser o ponto de partida para todo o restante processo de transformação e não o contrário. Por isso, o rebranding torna-se também prioritário. As alterações de era não são assim tão recorrentes. Aquilo que determina uma alteração de era é uma nova visão do mundo. Às vezes, só em retrospectiva se entende as implicações. Do iluminismo ao renascimento, ao mecanicismo, até hoje à designada Era 4.0, foram períodos muitos largos e com transição progressiva. A grande diferença desta era para as anteriores é que o ritmo de alterações de mudanças não tem precedentes e, portanto, as coisas podem mudar de um dia para o outro, literalmente falando. O Sporting CP já fez outros rebrandings no passado e faz agora todo o sentido na fase de transição que atravessamos. Há vários exemplos, de organizações e clubes, que fizeram recentemente rebrandings.
Há algum exemplo que destacaria?
Na minha opinião, um dos mais bem conseguidos foi feito pela Juventus FC. Diria mesmo que brilhante. E não digo por ser um exemplo dentro do desporto. Ocupou um espaço muito próprio. Icónico. Fora do desporto, penso que o recente rebranding da Peugeot também foi muito bem conseguido. Ambos geraram alguma polémica inicialmente, mas penso que ao dia de hoje a opinião positiva é quase unânime.
Antevê polémica no caso do Sporting CP?
Estes processos, pela sua natureza, geram sempre ruído. Há sempre opiniões diversas. Quem diga que deviam existir outras prioridades. Grupos de resistência. Resistências à mudança. É necessária habituação. E, normalmente, primeiro estranha-se e depois entranha-se. O próprio processo é difícil e pode ser demorado. É preciso acharmos que acertámos em cheio. Existem outros rebrandings e marcas que ocuparam alternativas que gostaríamos de explorar e, por eles já o terem feito, torna-se mais difícil. Existem processos de consulta e avaliação com grupos que vamos fazer, nomeadamente a consulta aos Sócios em sede de Assembleia Geral. Mas faz parte de qualquer processo de evolução, sobretudo com esta dimensão e valor simbólico, e também já foi feito no passado.
Quais são as características do Sporting CP que pretende ver reflectidas no rebranding?
O rebranding terá de representar o novo futuro a partir do nosso passado e da nossa herança. A marca deve ser sempre um reflexo daquilo que nós somos. Do que queremos ser. De como queremos ser percepcionados. Como actuamos. E de quem atraímos. As bases já foram estabelecidas em 1906. Existe uma evolução que parte dessas bases. Estarão estabelecidas no próprio documento de visão estratégica. Os nossos valores fundamentais permanecem os mesmos. Nascemos verdes e diferentes. Assim continuaremos. Em suma, tem de representar o que é ser Sporting CP. E representar de uma maneira muito tangível o que é a geração Sporting CP, que transmite o testemunho de geração em geração, em perpetuidade.